Mântua e Sabbioneta: pérolas Unesco na Lombardia
Viver em um país com o patrimônio artístico e cultural como o da Itália, faz sim com que você esteja sempre a poucos quilômetros das belas cidades, mas elas são tantas para conhecer, que as vezes passa um bom tempo até que você repita uma.
Foi assim com Mântua, que conheci há quase 10 anos atrás, em um bate e volta em um ensolarado sábado de maio. Corria o ano de 2005, mas eu tinha boas lembranças do lugar.
Eis que, entre as satisfações da minha breve vida de blogueira, fui convidada pelo projeto Blogville, setor turismo da Região da Lombardia e setor turismo da Província de Mântua para uma viagem de 2 dias na cidade junto com outros 4 blogueiros no final de setembro.
As atividades foram concentradas em Mântua e Sabbioneta, inseridas da lista dos Patrimônios Unesco (leia aqui o post sobre os patrimônios na Lombardia) em 2008 e infelizmente afetadas durante o terremoto de 2012 na região fronteiriça da Emilia Romanha.
Chegamos em Mântua de trem, partindo de Milão e depois do check-in no nosso hotel, fomos diretamente o agro turismo Corte Pagliare Verdieri onde nos esperava a simpática Mimma para a colheita da uva e a preparação do sugolo , uma espécie de pudim da região feito com o suco da uva e farinha. Depois de colher, espremer a fruta e preparar o doce, almoçamos e seguimos para Sabbioneta, onde nos esperava Manuela para um tour de 2 horas.
Sabbioneta
Fundada entre 1554-1556 por Vespasiano Gonzaga como cidade ideal, foi pensada sobretudo como uma fortaleza, completamente cercada pelas muralhas que até hoje se atravessam para entrar e que com certeza naquela época representavam um dos baluartes mais equipados da Lombardia de domínio espanhol.
Colocada entre os grandes estados regionais da época: Ducado de Milão, Ducado de Mântua e Ducado de Parma e Piacenza, o pequeno estado foi construído com base nos princípios humanísticos de cidade ideal.
Possível ainda ver entrando na cidade, o traçado ‘alla romana’ do Cardo e Decumano, que marcam as duas principais ruas da cidade. A visita começou pelo Palazzo Giardino, onde salas de tetos de madeira trabalhadas e folheadas a ouro e grandes galerias como o Corredor Grande eram destinados a recepção de convidados.
Como não poderia deixar de ser, a graciosa cidade renascentista também tem seu Palazzo Ducale, suas igrejas importantes e até o primeiro teatro da era moderna, o Teatro Olímpico, construído em 1590 e ainda hoje operativo.
O tour terminou com a visita a Sinagoga, construída no século 19 em estilo neoclássico pela comunidade hebraica da cidade, que se dedicava a atividade de estampa. No andar superior é ainda possível visitar a sala de orações, decorada com alguns móveis da época.
Todos os quatro monumentos que visitamos fazem parte de um bilhete comum de 12 euros que pode ser comprado nos escritórios da IAT na Piazza delle Armi. É possível também visitar cada monumento separadamente ao custo de 5 euros cada.
Visitar Sabbioneta é como voltar um pouco no tempo, já que a cidade representa um perfeito exemplo das teorias renascentistas da construção da cidade ideal. A cidade fica a cerca de 20km de Mântua e deve ser incluída no seu roteiro caso esteja passando por lá.
Mântua
A manhã do segundo dia era destinada ao tour guiado pela ótima Rosella pelas ruas de Mântua, cidade de arte lombarda e um dos grandes centros do Renascimento italiano nessa área.
Ainda que 10 anos tenham se passado, eu tinha nítidas lembranças da cidade, da sua Piazza delle Erbe com seu Palazzo Vecchio (em reformas depois do terremoto de 2012), Palazzo Nuovo, a Torre do Relógio e a Rotonda de San Lorenzo, igreja de arquitetura românica com planta central.
Ali ao lado, a magnifica basílica renascentista de Sant’Andrea, maior igreja de Mântua, projetada pelo arquiteto Leon Battista Alberti, com seu interior a nave única completamente decorado e completado pela grande cúpula.
A história da construção basílica é ligada a relíquia de um vaso com o sangue de Jesus . Vários peregrinos viajavam a Mântua para venerar o objeto, ainda hoje guardado em uma cripta na igreja (não visitável).
Mas antes de visitarmos o famoso Palácio Ducal da cidade, onde eu esperava ansiosa pelo Quarto dos Noivos, a surpresa da visita para mim foi o lindíssimo Teatro Bibiena, pérola construída entre 1767-69 e no qual um ano depois da inauguração, um jovem Mozart (14 anos) tocou. Em uma carta para a esposa, Mozart pai escreve: hoje eu conheci o teatro mais lindo do mundo.
Acho que ele tinha razão. O teatro é muito bem conservado e ainda hoje funciona para pequenos concertos e congressos. Se você estiver batendo pernas por Mântua, não deixe de dar um pulo. Vale muito a pena.
Mas quem vai a Mântua não pode pensar na cidade símbolo da família Gonzaga sem pensar em duas grandes construções: o Palazzo Ducale e o Palazzo Tè.
Palácio Ducal
Mais do que falar em palácio, podemos dizer que o complexo arquitetônico de Mântua é uma cidade palácio, já que o conjunto é enorme, composto de várias construções que foram anexadas.
A partir do século 14 foi a residência da família Bonacolsi e sucessivamente dos Gonzaga e ali moravam: o Gonzaga dominante na época, a esposa, o filho primogênito e os outros filhos legítimos até a maior idade e alguns convidados.
Corte Velha, Corte Nova, o Castelo de São Jorge são alguns dos edifícios que formam o imenso complexo. Ainda que suas salas hospedem afrescos, tapetes e decorações de grande valor, quem vai a Mântua e ao Palácio Ducal, vai para ver o famoso Quarto dos Noivos, sala afrescada por Andrea Mantegna e uma das grandes obras do Renascimento Italiano.
A entrada na sala é com hora marcada e a permanência é de 5 minutos. Depois do terremoto de 2012 que afetou as instalações do palácio, o quarto ficou fechado por 2 anos para restaurações e foi reaberto temporariamente para as visitas durante esse verão (até outubro 2014).
A sala cúbica, usada muito provavelmente para audiências com o duque, foi pintada entre 1465-74 pelo então pintor de corte Mantegna. O tema geral é a celebração política-dinástica da inteira família Gonzaga com a ocasião da eleição de Francesco Gonzaga como cardeal.
Quatro paredes afrescadas e um teto com uma deliciosa decoração onde anjinhos debruçados olham para baixo, espiando o interior da sala.
Com só cinco minutos lá dentro, realizando um sonho de consumo artístico, não sabia se olhava ou fotografava. Mais olhei que fotografei e nem todas as fotos que mostro aqui, são minhas. Mas valeu a pena!
O passeio pelo palácio prossegue com a visita aos vários ambientes, que hospedam quadros, afrescos e uma linda coleção de tapetes produzidos na Bélgica a partir dos desenhos de Raffaello. Até eu que não sou de tapetes, fiquei encantada.
Palácio Tè
Outro grande edifício monumental da cidade, casa de relax de Federico II Gonzaga, que a usava para hospedar sua amante oficial e para suas festas refinadas.
O grande edifício quadrado com um pátio no meio, é cheio de grandes salas afrescadas pelo seu também arquiteto, o grande Giulio Romano, que em apenas 10 anos terminou a construção. A sala do Gigante e de Amor e Psique valem a visita e completam um tour por essa pequena pérola que é a cidade de Mântua.
Confesso que Palácio Tè foi uma das minhas etapas na minha passagem por Mântua há dez anos atrás e dessa vez, com a tarde livrem preferi explorar a beira do lago que contorna a cidade.
A caminhada foi até que longa, mas eu não tinha tempo para um passeio de barco pelas águas do Mincio, o rio das redondezas que formam os lagos em volta da cidade.
Fazer o que? Vou ter que voltar!
Gastronomia
Quem conhece a Itália sabe o quanto é variada a sua gastronomia. Viajamos pouco mais de 100 k de Milão a Mântua e os pratos típicos já mudam completamente.
Parte da nossa experiência também incluía o jantar da sexta e o almoço do sábado em restaurantes que serviam os pratos da região. O mais famoso deles é o tortellini de zucca (torteli de abóbora) quase sempre preparado na manteiga e salvia.
Uma das minhas lembranças de 10 anos atrás era o restaurante onde tínhamos almoçado, mas não me lembrava do endereço e nem do nome. Qual não foi a minha surpresa quando na sexta a noite, depois de caminhar um pouco pelas ruas da cidade que começava a encher, reconheci o L’ochina Bianca, o restaurante onde tinha estado anos atrás.
Não preciso dizer que o menú era bem variado e cada um escolheu um prato diferente: quem primeiro prato, quem segundo. Eu acabei optando por uma massa com ragú de carne de asno. Sim, eu sei, pode parecer estranho para quem não está acostumado, mas é uma daquelas coisas que você não encontra todas as semanas nos restaurantes.
Eu sou meio chatinha para comer, apesar de ter melhorado muito nesses anos aqui, mas quis experimentar. A carne estava saborosíssima. Aprovado.
Para fechar, uma sobremesa com creme de zabaione (adoro) e o dia se concluía de maneira perfeita.
O almoço do sábado foi ao ar livre, no pátio do Giallo Zucca, onde tinham nos preparado um menú degustação com uma entrada de peixe com polenta, torteli de abóbora e risotto alla pilota, que não é um risoto como conhecemos, mas mais parecido com nosso arroz (sequinho) feito com linguiça.
Tudo regado com um ótimo vinho branco.
Como vocês podem perceber, Mântua não decepciona na beleza e na gastronomia.
Onde ficar
Com certeza a oferta de hotéis de Mântua é bem diferenciada.
Nós fomos hóspedes do Residence In Centro que fica perto da estação de trem e em uma antiga construção eclesiástica oferece 34 apartamentos-quartos de diferentes dimensões.
O meu era bem grande, no térreo e além de 2 camas de solteiro, era equipado com cozinha, micro-ondas, mesa e cadeiras, geladeira e TV. O banheiro também tinha secador e o residence dispõe de wi-fi grátis e possibilidade de café da manhã por 6 euros (a nossa estava incluída) que inclui café, sucos, croissants, pães, geléias, iogurte, frios e bolos.
Como chegar
Para quem está de carro, a solução de Milão é pegar a rodovia A4 em direção Veneza e depois desviar na A22 e sair em Mantona Nord.
De trem (como fizemos) a opção são os trens regionais da Trenitalia, que ligam Milão a Mântua em 2 horas. Sim, é o mesmo tempo chegar a Veneza, mas os trens regionais são mais lentos e param em todas as estações.
Mesmo assim, é uma viagem que vale muito a pena. Mais uma cidade lombarda que tem muito para te surpreender.
Fotos: Milão nas mãos – exceto vista de Sabbioneta e Palácio Té (Wikicommons)
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