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A Pinacoteca de Brera

Apesar das recentes aberturas do Museu Novecentos e da Gallerie d’Italia e da maior notoriedade que a exposição dos Códigos Atlânticos de Da Vinci tenha dado a Pinacoteca Ambrosiana, o museu com mais prestígio de Milão é, com certeza, a Pinacoteca de Brera.

Situada no primeiro andar do antigo Palácio de Brera, faz parte do complexo que reúne outras instituições como a Academia de Belas Artes, a Biblioteca Braidense e o Jardim Botânico.

O bairro homônimo foi, no passado, um dos mais característicos graças aos artistas que frequentavam a Academia e o seu estilo boêmio feito de bares e bordéis. Hoje, é ainda um dos bairros característicos de Milão, mas por outros motivos: ainda é um bairro boêmio e ponto de referimento para a noite milanesa, mas os decadentes bordéis deixaram espaços para galerias de arte e lojas descoladas. Assim, o bairro virou um dos lugares mais chiques e in da cidade.

O Palácio de Brera foi um convento de jesuítas no século 16 e já abrigava um centro de estudos. Durante a dominação austríaca em Milão, a imperatriz Maria Teresa d’Austria baniu os jesuítas e em 1776 fundou a Academia de Belas Artes. A Pinacoteca nasceu inicialmente com finalidades didáticas: deveria constituir uma coleção de obras (moldes e pinturas) que os estudantes da Academia podiam usar como modelos.

 

Patio Pinacoteca Brera Milao

Com a chegada dos franceses, por vontade de Napoleão, nos primeiros anos do século 19 a Pinacoteca se transformou em um museu que tinha a intenção de expor as obras mais significativas dos territórios conquistados pelas armadas franceses. Em particular, abrigou numerosos quadros e afrescos descolados que pertenciam às igrejas e conventos banidos pelo novo governo.

A Pinacoteca de Brera, diferente de outros museus, como a Pinacoteca Ambrosiana, o museu Poldi Pezzoli ou o Bagatti Valsecchi, não nasceu do colecionismo privado mas de uma coleção do governo. O aumento dessa continuou com doações, trocas e aquisições, como por exemplo, a belíssima Ceia em Emaus de Caravaggio.

Brera Milao Ceia em Emaus Caravaggio

Na história da cidade, os milaneses sempre foram doadores  generosos: em 1982 a familia Jesi doou à Pinacoteca uma rica coleção de 60 obras dos maiores artistas italianos do início do século 20 (entre eles, Boccioni, Modigliani, Morandi e Martini) e alguns estrangeiros, como Picasso. Dessa maneira, a Pinacoteca preencheu uma lacuna e hoje permite aos visitantes uma excursão também nas obras do século 20, antes essencialmente ausente no percurso.

Picasso Modiglini Pinacoteca Brera Milao

A coleção Jesi  é só um dos exemplos das obras presentes em Milão que são  frutos de doações e que incluem também obras no Duomo, passando pela Pietà Rondanini de Michelangelo, exposta no Museu de Arte Antiga do Castelo Sforzesco e chegando até muitas das obras expostas no Museu Novecentos.

A Pinacoteca abriga um número incrível de artista e obras primas. A já citada Ceia em Emaus de Caravaggio o e O Casamento da Virgem de Rafaello são só algumas das obras presentes ao lado de outras de artistas como Mantegna, Tintoretto, Bramantino, Bergognone, Bellini, Luini e Hayez.

Casamento da Virgem Rafaello Brera Milao

Para quem está em Milão e aprecia um pouco de arte, uma etapa na Pinacoteca de Brera é obrigatória. A visita com um percurso dos quadros mais importantes dura mais ou menos 2 horas.

Pinacoteca di Brera 
Via Brera, 28  
De ter a dom das 8.30 às 19.15
Sextas até as 21.15
Fechada: segundas, 1 janeiro, 1 maio, 25 dezembro
Ingressos: 10 euros (inteiro) e 7 euros (reduzido)
Entrada grátis todo primeiro domingo do mês
Audioguia: 5 euros (disponível em  italiano, inglês, francês, espanhol e alemão)
 

 

Milão macabra: San Bernardino alle Ossa

Sim, como vocês podem intuir pelo título se trata de verdadeiros ossos humanos. No nome dessa igreja, pouco conhecida mas situada bem no centro e, por isso, facilmente acessível até para o turista mais apressado, tem também o seu conteúdo.

Igreja San Bernardino alle Ossa Milao

O exterior da igreja de San Bernardino alle Ossa

O ossário original foi construído no início de 1200 para acolher os restos do vizinho cemitério, que tinha se tornado insuficiente e pouco depois foi construída ao seu lado, uma igrejinha. O ossário foi danificado na queda da torre do sino de uma outra igreja alí ao lado (Santo Stefano) e foi reconstruído em 1676 como o vemos hoje, com as paredes decoradas por crânios e ossos humanos.

Ossario San Bernardino em Milao

O interior do ossário

No ínicio de 1700 foi construída a igreja atual e o ossário foi anexado, tornando-se meta de pelegrinação. As duas construções são ligadas por um pequeno corredor.

Do resto, não acrescento mais nada: mais do que uma longa descrição, essa igreja merece uma visita. São um dos poucos ossários (barrocos) do mundo.

ossario san bernardino em Milao

Detalhe de uma das paredes do ossário

Diz a lenda que quem a visitou em 1738 foi Don João V, rei de Portugal. Ficou tão encantado pela peculiar capela de ossos que decidiu construir uma semelhante em Évora.

Fotos: internet

San Bernardino alle Ossa
Via Carlo Giuseppe Merlo 4
Acesso livre
Seg. a sex: das 07.30 às 12.000 e das 13.00 às 18.00
Sábados: das  07.30 às 12.00
Domingos: das 09.00 ás 12.00
 

A mostra de Modigliani e a história das cabeças falsas

Foi inaugurada na semana passada no Palazzo Reale a mostra Modigliani, Soutine e os artistas malditos. A coleção Netter: mais de 120 obras de Modigliani, Soutine, Utrillo, Suzanne Valadon, Kisling e muitos outros artistas judeus ativos na Paris boêmia no ínicio do século 20, reunidas por Jonas Netter, caçador de talentos e colecionista.

Quadro Mostra Modigliani Milao

A obra Elvire com gola branca

Essa belíssima mostra nos dá a oportunidade de recordar o que aconteceu há quase 30 anos em Livorno (Toscana), cidade natal de Modigliani.

A história das falsas cabeças atribuídas a Modigliani encontradas nas valas livornesas em 1984 foi contata de muitas maneiras e com grande ênfase pela mídia que, no acontecimento, desempenhou um papel fundamental desde o início.

Descoberta obras modigliani livorno

A descoberta das esculturas em 1984

Durante a mostra celebrativa do centenário do nascimento de Amedeo Modigliani, na Vala Real de Livorno foram encontradas três cabeças esculpidas que muitos críticos e estudiosos de arte não exitaram em atribuir a Modigliani. A tese era de que o artista tivesse jogado as esculturas, inacabadas, porque não estava satisfeito com o próprio trabalho. Acolhida por todos os envolvidos como uma descoberta fantástica, a notícia se espalhou por todo o mundo até o momento que se descobriu que era tudo uma piada: uma brincadeira bem pensada de um grupo de estudantes livorneses, que tinham esculpido uma das três testas em uma noite, em uma garagem e usando ferramentas como uma furadeira Black  & Decker (marca que utilizou o acontecimento como publicidade).

Inicialmente os críticos não acreditaram na versão dos três rapazes e os acusaram de serem mitomaníacos. Os três foram obrigados a realizar novamente, ao vivo em um canal TV, a mesma escultura para colocar fim as dúvidas.

Os estudantes autores da brincadeira

As outras duas cabeças encontradas foram esculpidas por um artista que queria desmistificar os mitos construídos pela sociedade de consumo. A brincadeira é uma das mais famosas e bem sucedidas já realizadas no país e nos faz interrogar sobre a arte, os valores atribuídos às operas de artistas famosos e à potência dos meios de comunicação. Se os três estudantes não tivessem “se entregado” , hoje as três cabeças estariam expostas em algum museu com sistema de segurança moderno e valeriam milhares de euro.

 

Modigliani Soutine e gli artisti maledetti. La collezione Netter
Palazzo Reale – Praça Duomo
De 21 de fevereiro a 8 de setembro 2013
Segundas: 14.30-19.30
De Terça a Domingo: 9.30-19.30
Quinta e Sábado: 9.30-22.30
Ingressos: 11 e 9,50 euros

Milão: cidade de cariátides e telamones

Eu já comentei aqui que Milão não é uma cidade de beleza óbvia, escancarada, para turistas principiantes e desavisados. Eu digo turista porque esse é também um blog de turismo, mas mesmo muitos habitantes não sabem ver Milão com bons e educados olhos.

É uma cidade onde você tem que caminhar prestando atenção nos portões abertos de muitos palácios para ver se tem a sorte de descobrir os mais belos pátios da Itália (prometo um post sobre eles), caminhar olhando para cima, quando possível, para admirar seus jardins suspensos. Mas uma das coisas que mais adoro aqui, são essas quantidades infinitas de homen e mulheres “encostados” nas fachadas de palácios mais ou menos históricos das cidades e até das igrejas, como o Duomo. Quem são? As famosas cariátides e telamones.

estatua cariatide milao

Detalhe de uma cariátide em Milão

Cariátides são as esculturas utilizadas como sustentação, estrutural ou decorativa em uma construção. Seus equivalentes masculinos são conhecidos como telamones, chamados assim porque lembram Atlante, que na mitologia grega sustentava os pilastres do céu.

Utilizadas na antiga Grécia, são retomadas na arquitetura romanica italiana e, posteriormente nos séculos 16 e 17.

Estatua Duomo Milao

Telamone na fachada do Duomo

Meu palácio preferido em Milão é o Palazzo degli Omenoni (que faz parte das fotos do cabeçalho do blog), que significa Palácio dos Homenzarões e foi a casa de um excêntrico escultor do século 19, Leone Leoni. A residência deu nome a rua (Via degli Omenoni) e eu, todas as vezes que estou por perto, dou uma desviada e passo pela frente. A sensação de que aqueles 8 homenzarões estão alí  te seguindo e por que não, te cumprimentando, é impagável.

Casa Omenoni Milao

A famosa Casa Omenoni em Milão

Mas Milão tem várias e vários cariatides e telamones, incluindo as da famosa Duomo de Milão. Mas as mais famosas e que fizeram história na cidade, foram as duas estátuas criadas para o Palazzo Castiglioni em Milão, no ínicio do século 20 em plena sintonia com o novo estilo arquitetônico, o Liberty.

A cidade não estava pronta. Quando em 1903 foram retirados os andaimes da frente do palácio, a opinião pública se escandalizou com as duas estátuas que representavam duas graciosas donzelas desprovidas praticamente das roupas. O escândalo não impediu que os milaneses apelidassem o palácio de “Casa do Bumbum”. De qualquer maneira, as estátuas foram retiradas e 10 anos depois foram colocadas em um outro edifício, Villa Faccanoni, mas de localização menos central. Os bumbuns ainda estão lá.

Cariatides em Milao

As escandalosas cariátides do Palácio Castiglioni

Por isso, se você está passeando tranquilo em Milão, a dica é não olhar só as vitrines. A cidade oferece muito mais do que isso. Se delicie com as cariátides e telamones milaneses e eleja os seus preferidos.

A Última Ceia de Da Vinci: história e curiosidades