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Deu no New York Times

Milão cidade que não tem nada para se ver. Milão cidade de negócios, a São Paulo italiana. Milão (só) cidade da moda e design.

Escuto frequentemente esses comentários sobre a cidade para onde me mudei há 13 anos e da qual escrevo há 2 anos nesse blog. Mas quem segue o Milão nas mãos também deve ter lido várias vezes eu dizer que Milão não é uma cidade óbvia ou uma cidade para turistas (e até moradores) preguiçosos, daqueles que querem belezas escancaradas em suas caras e segredos facilmente desvendados em cada esquina.

Só quem vive realmente uma cidade pode colher a sua essência, seja ela qual for. Então, me desculpem os viajantes desavisados, que aqui chegam esperando encontrar roupas penduradas nos varais das ruas estreitas da cidade ou senhoras vestidas de preto sentadas nas portas de casa.

Capital da moda e do design sim, Milão é também a capital econômica do país e isso lhe confere um ar mas cosmopolita em relação a outras cidades italianas. Sem falar na grande quantidade de arte, cultura e história que também temos aqui.

E agora, que a cidade atrai a atenção do mundo em vista a Expo, um vídeo de 6 minutos publicado na sessão Viagens do portal do Jornal New York Times no dia 7 de janeiro, descreve Milão como uma cidade bela que não se entrega a primeira vista, em pequenas entrevistas a moradores e alguns empreendedores que fazem da cidade o que ela é: italiana, mas com um olhar internacional.

HangarBicocca, Pavè, Gallerie d’Italia, Al Taglio, Nonostante Marras, Ceresio 7, Un posto a Milano são alguns dos lugares mostrados no vídeo e exemplos da Milão que não se repousa, mas que sabe viver.

Aqui fica o vídeo com uma minha pequena dica: na sua próxima passagem por aqui dedique mais tempo a cidade e se lembre que Milão é para entendedores. Deixe-se surpreender.

5 curiosidades para você procurar em um passeio por Milão

Em qualquer cidade do mundo, existem sempre curiosidades, que muitas vezes passam despercebidas por turistas e até locais. O significado de um monumento, de uma estátua, de um desenho em um muro e por aí vai.

Por aqui não é diferente e resolvi selecionar só 5 curiosidades sobre Milão (as que geralmente eu mostro durante os passeios culturais) para tornar seu passeio quase uma experiência investigativa. Três deles ficam concentrados na Praça Duomo e você só não vai procurar na sua próxima passagem por Milão, se não ler esse port.

1. A PORTA “BOMBARDEADA” DO DUOMO

Para quem não sabe, Milão foi intensamente bombardeada durante a Segunda Guerra Mundial e os bombardeiros de agosto de 1943 foram os mais intensos. A nossa catedral não foi diretamente bombardeada e diz a lenda que foi por causa de um acordo verbal feito entre o cardeal de Milão, Idelfonso Schuster com os ingleses.

curiosidades de Milão

Mas os arredores do Duomo foram destruídos e o Palazzo Reale, Galleria, Scala e até a loja La Rinascente, saltaram pelos ares. Com isso, parte da catedral foi danificada com os estilhaços dos pesados bombardeios, que lançaram toneladas e toneladas de bombas na cidade.

Na porta central do Duomo é possível ver as marcas nas cenas que contam a história da vida da Virgem Maria.

2. O CALENDÁRIO SOLAR DO DUOMO

Mais uma entre as várias curiosidades da catedral que muita gente nem percebe, já que entra olhando para cima, impressionados com a sua grandiosidade.

Mas mesmo quem olha o lindo pavimento original do século 16, às vezes não entende o que fazem ali, em uma igreja, os desenhos dos signos do zodíaco.

O calendário do Duomo fica perto das portas frontais e é uma linha de bronze que corta de norte a sul o chão e ainda sobe por três metros pela parede (norte – nave da esquerda), onde termina com a imagem do signo de Capricórnio.

Ele foi colocado em 1776 durante o domínio austríaco e é de clara influência iluminista. Ele foi realizado por dois astrônomos de Brera e foi pensando para mensurar com precisão o meio dia e para determinar a data (móvel) de Páscoa.

Como funciona? Entrando na catedral, vá até o lado direito e olhe para o teto. A 24 metros de altura você vai ver um pequeno furo. É ali que ao meio dia (solar) entra a luz do sol e marca na meridiana a hora e o período do ano.

Esse ano, durante um passeio cultural, entrei na catedral as 13h11 (horário de verão) do dia 21 de junho, dia do solstício de verão. Nem tinha me ligado na data e quando fui mostrar a meridiana, um pequeno grupo de milaneses estava em volta do desenho do signo de Câncer.

milão curiosidades

Ficamos parados esperando que a faixa de luz solar se aproximasse do desenho. As 13h17 a luz iluminava do desenho marcando o dia 21 de junho. Impressionante.

Quando o calendário/relógio foi realizado, um funcionário ficava controlando a luz e quando a luz marcava meio dia, ele saía no adro da igreja e agitava uma bandeira branca. Um colega, que ficava na torre do Palácio do Giureconsulti (do outro lado da praça) o via e também agitava uma bandeira branca em direção ao Castelo Sforzesco, onde finalmente um soldado dava o sinal e disparavam um tiro de canhão para marcar o meio-dia.

A próxima vez que você entrar no Duomo, não perca. Todo mundo se diverte tentando achar o próprio signo.

3. AS SETAS NA PRAÇA DUOMO

A praça monumental milanesa tem várias atrações turísticas: o Duomo, a Galeria, o Museu 900, o Palácio Real, a enorme estátua de Vittorio Emanuele no meio. Com tantas “distrações”, ninguém repara nas duas setas meio apagadas que ficam em duas colunas dos pórticos ao lado norte da praça, em frente a uma das entradas do metrô.

Milão dicas guia de Milão

Elas sinalizavam os abrigos subterrâneos pela cidade durante a Segunda Guerra Mundial.  Várias delas estão espalhadas por outras partes da cidade.

4. O INTERFONE ORELHA

Poucos turistas se aventuram pelos arredores de Corso Venezia. Uma pena, já que a zona é uma das mais elegantes de Milão (a minha preferida) com seus palácios do século 18 (ao longo do Corso) e suas ruas tranquilas que formam o Quadrilátero do Silêncio emoldurado pela bela arquitetura Liberty do início do século 20.

orelha_milao

Em um desses palácios, em Via Serbelloni 10, no Palácio Sola Busca, fica uma originalíssima orelha esculpida em mármore pelo escultor milanês Adolfo Wildt nos anos 30 e que por alguns anos serviu de interfone. Hoje não funciona mais, mas não tem quem passe e não tire uma foto.

5. O ‘CONTORNO’ DA COLUNA INFAME

A história é milanesíssima e mesmo assim muitos locais não a conhecem. Tudo começa no século 17, durante a pior peste que se abateu sob cidade: a grande peste de 1630, onde 1/3 da população morreu.

O medo e o fanatismo permeavam a ‘lenda’ de que a peste era transmitida por improváveis “untores” , nome que em do verbo untar, lambuzar, que apoiados a muros e portas transmitiam através de um unguento, a fatídica doença.

Até que um dia, um pobre do agente de saúde foi acusado por duas mulheres de ter sido visto passando a mão em uma porta. Capturado e torturado, confessou e indicou um cumplice, o barbeiro Gian Giacomo Mora.

Na barbearia do coitado, em Corso di Porta Ticenese, foram encontrados pastas, pomadas e unguentos (temos que lembrar que esses profissionais também eram médicos, na época) que foram confundidos com a substância pestífera.

Gian Giacomo também foi capturado, torturado de forma bárbara e achando que poderia livrar a pele, mentiu, confessando tudo.

Os dois foram levados para Piazza Vetra (atrás da Basílica de San Lorenzo) e foram colocados em uma roda, tiveram todos os ossos quebrados, ficaram expostos por 6 horas antes de serem queimados vivos.

A barbearia foi demolida e no lugar foi colocada uma coluna de granito e uma lápide, que lembrava a barbaridade cometida. Em 1803 a coluna foi destruída e a lápide hoje fica no pórtico do Elefante no Castelo Sforzesco.

Quem desce hoje o Corso de Porta Ticinese quase nem repara na obra na esquina da Rua Gian Giacomo Mora e se repara, não entende a escultura côncava que fica na esquina.

milao_segredos

Ela está ali, como o ‘contorno’ da Coluna Infame destruída, lembrando uma história que está longe, mas que foi um dos episódios negros da cidade. Uma outra lápide colocada em frente explica a história.

Para cada uma dessas curiosidades, Milão tem muitas outras, bem interessantes, mas quem sabe ficam para um outro post.

Milão em 1 dia: dicas do que fazer

A minha Milão

Milão: cidade de águas

Barcelona, Milão, Porto. O que essas cidades tem em comum?

Esse post faz parte da Blogagem Coletiva Barcelona- Milão-Porto, que todas as quinta de Abril vai mostrar um pouco das coisas em comum dessas 3 grandes cidades europeias, pontos de referências em seus países, com a participação de Cristina Rosa do blog  Sol de Barcelona e Rita Branco do blog O Porto Encanta.

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Paris, Londres, New York, Roma, Lisboa, Amsterdan, Veneza e minhas cidades amigas de blogagem coletiva Porto e Barcelona.

Quem pensa em alguma dessas cidades, não pode pensar nelas sem pensar nos seus rios, canais ou mar. Não acontece o mesmo em quem pensa em Milão. Mas o título do post não é uma brincadeira, ainda que a minha amada cidade não seja páreo para as outras cidades no que diz respeito ao volume de água.

Quem já esteve por aqui e passeou bem, andando além dos confins do centro histórico, deve ter chegado ao bairro Navigli, que em italiano quer dizer canais e que hoje preserva uma pequeníssima parte do que era a rede de canais dessa cidade.  Sim, Milão era chamada “città d’acqua” e se nunca foi uma Veneza, chegou bem perto.

O Naviglio Grande hoje

O Naviglio Grande hoje

Os canais de Milão tem origem em tempos antigos e já em época romana a cidade contava com seus cursos de água, resultados dos desvios dos rios presentes nas redondezas. Mas foi só no início do século 12 que os milaneses começaram a construir os que viriam a ser os canais da parte interna da cidade, navegáveis inteiramente só no século 13.

Os canais milaneses foram de grande importância para a vida cotidiana, a agricultura e o comércio da cidade. Também foi  fonte de energia idroelétrica e via de comunicação e de transporte, já que ligava a cidade com os lagos de Como,  Maggiore e Ticino.

Basta pensar no maior símbolo de Milão, o Duomo e no material da qual é feita, o belíssimo mármore de Candoglia. A cidade fica a 82km de Milão e abriga ainda hoje a grande jazida particular da catedral. Por séculos o mármore extraído de lá, viajava e chegava até Milão, em um laguinho atrás do canteiro, pelos canais.

Foram também esses mesmos canais que na época do Renascimento encantaram Leonardo Da Vinci, que permaneceu na cidade por 20 anos, a serviço do duque e que, com a sua curiosidade de gênio, não podia deixar de se interessar por eles e seu grande desafio: os desníveis acentuados ao longo dos trajetos.

Uma das comportas dos canais. Foto: Arnaldo Chierichetti

Uma das comportas dos canais. Foto: Arnaldo Chierichetti

O problema já tinha sido em parte resolvido com a construção de pequenas bacias, mas Leonardo não perdeu tempo e estudou e projetou sistemas de comportas e eclusas, que seriam construídas só anos depois.

Além do aspecto logístico dos canais, a população milanesa por anos os usou para pescar, nadar e lavar roupas. Eles eram parte importante e integrante da cidade  até a segunda metade do século 19, quando a revolução industrial sacudiu o mundo e novas indústrias, maneiras de produzir e as ferrovias surgiram.

A vida em volta dos canais da cidade

A vida em volta dos canais da cidade

A área que chamamos de Darsena e que hoje  está sendo compleatamente restruturada em vista da Expo2015, foi por anos o oitavo porto italiano. Mas com os anos os canais caíram em desuso por serem um meio de transporte lento (3km/h) e as novas indústrias começaram a jogar seus lixos em águas milanesas.

A Darsena. Foto: Arnaldo Chierichetti

A Darsena. Foto: Arnaldo Chierichetti

Nos anos do governo fascista, motivado por novas exigências higiênicas e de viabilidade viária, o Ministério das Obras Públicas decide pela cobertura da parte interna dos canais, criando um anel que hoje chamamos de Cerchia dei Navigli.

Sim, hoje quando passeamos ou dirigimos nossos carros modernos sob certas ruas de Milão, o fazemos sobre as águas dos antigos canais.

A mesma rua com e sem canal

A mesma rua com e sem canal

Ainda assim, os canais existentes em Milão são cinco e juntos cobrem um trajeto de 150km, em grande parte nos territórios aos arredores da cidade.

Atualmente existe uma associação que propõe um projeto, talvez utópico e de custos altíssimos, que é a reabertura dos canais da cidade, coisa que mudaria completamente a cara e a vida da cidade, porque temos que concordar: uma cidade com água, é uma cidade mais bonita.

Vida noturna nos canais milaneses

Vida noturna nos canais milaneses

A nós milaneses não nos resta que passear e fazer happy hour na pequena, bela e movimentada zona dos canais e tentar imaginar como era Milão quando podia ser comparada, ainda que só em parte, com suas amigas Barcelona e Porto, onde as águas reinam e dão até nome a cidade.

Para conhecer a história das águas em Barcelona e no Porto, clique nos links abaixo.

Porto: cidade de águas – Porto Encanta

Barcelona: cidade de águas – Sol de Barcelona